segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Breve (Augusto Simões)

Quando já não esperava mais, cravou-me um beijo e não quis mais nada. Nem parecia tão distante. Atravessou o mundo e não se importou com o desconhecido. Deu-se, quis e quis mais. Nada parecia menos, tudo tornou-se mais. Queríamos mais, fomos muito mais, sentimos demais. Tudo era pouco perto de nós. Nenhuma alegria nos alcançava, nenhum sorriso era mais aberto. Beijamo-nos aos pulos, aos abraços, sentados, encostados, esbarrando em todos enquanto girávamos juntos. Virávamos um só e só nos soltávamos quando pensávamos se seriamos além. O que seria além, uma vez que nos encontrávamos muito além do que achávamos ser além. Distantes de todos, em meio à multidão, éramos outros e todos sem qualquer distinção. Apenas tudo o que precisávamos. Nem sequer sonhávamos por que lá já era o sonho que nunca sonhamos ter. Tudo erámos nós, nós éramos tudo e nada havia entre nós. Só fomos e mesmo que pudéssemos ainda ser, seriamos um pouco menos, por que nada será como fomos. 

domingo, 16 de setembro de 2012

Escora


Dito em palavras toscas, mensagens distorcidas, o sinal da derrota é sempre confuso e ao mesmo tempo claro. Não se fazem mais amigos como antigamente, não se fazem mais laços como sempre, tudo o que resta é o pouco que sobra de si para transformar em bengala e se apoiar até que se recupere.

“Levanta, sacode a poeira e dá a volta por cima”, “Não desista nunca”, “a insatisfação movimenta o mundo” e quando todos os ditados, mesmo que fazendo sentido, não surtem efeito? A caminhada é longa, mas nem sempre o caminho é claro. Bifurcações, pedras, rochas, paredes, o que mais se pode se por na estrada?

Tudo que sobra é o pedaço que ainda há em si mesmo. Posto que, ao redor, não nada ou ninguém em quem se apoiar. E quando tudo é falho e frágil? Todo banco ou encosto pesa ou pende na direção oposta e tudo que foi construído e deveria suportar simplesmente clama por suporte. Seu peso, mesmo quando não existe é medido pela simples presença ou ausência no horário incorreto.

Se levantar é difícil, se rastejar é incômodo, parar é cruel e mal visto. Mexa-se e condene-se, pare e envergonhe-se. Todos não se importam, mas ninguém se importa. É o paradoxo do mundo visível. A antítese do mundo atual que sonha tanto com o ideal que nem sequer tem tempo para construí-lo.

Discursos, livros, compreensão, estudos e onde anda a ação? Sai caro demais. Gasto de empenho, gasto de energia, gasto de dinheiro, gastos com argumentos. Por demais. Não façamos pois já sabemos como fazê-lo. Fê-lo? Não , não, Pode ficar melhor.

A.S.

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Morina Filósofa

Atormentada e perdida, vivera uma história já findada em seu passado. Apesar de seus pesares, era a vida que conhecia. Pensava sempre se era a coisa certa a fazer, mas o que poderia entender como mais correto se nada experimentara há anos, se nada era além do que se tornara?

Deixou-se sucumbir em falsas esperanças e no cotidiano que cercara seus dias. Por mais que doesse, era rotineiro, comum, era uma vida que sabia viver. Nada era excitante, nada desafiava. Suas mãos acariciavam, seus lábios beijavam, seus calores eram saciados quase que de forma automática. Conhecia aquilo como paixão, via naquilo o amor.

Quando enfim tomada pelo limite, viu-se apta a agir, mesmo que completamente assustada, dando um fim ao que jazia há muito em sobras de lembranças e sentimentos tão vívidos outrora que não se justificavam findados por razão alguma. Tomou um impulso e, mesmo ainda dando-se ao papel de pedir aprovação, deixou a caverna e foi buscar o que havia além daquela luz que lhe machucava os olhos e lhe assustava tanto que jamais, após tantos anos, imaginara ver outra vez.

Viu-se em meio aos sorrisos, às novidades, às possibilidades. Olhou cada pedaço e prometeu para si que não haveria de se encontrar em qualquer lugar obscuro tão cedo. Fez-se livre como poderia. Gritou para o buraco onde vivia “estou livre! Tão livre que até posso voltar aqui e sair outra vez!” Mostrou ao mundo como poderia viver sem deixar seu passado para trás.

Após meses de caminhada encontrou o que não buscava. A liberdade. Seu coração voltara a palpitar, seus sentimentos e emoções pareciam mais vivas que nunca, mas seu medo de ver-se presa ao que quer que fosse a afastava da liberdade. Morina tinha tanto medo de encontrar-se presa que fugiu da liberdade tão sedutora ao encontro do todo.

A caverna voltou a bater em suas veias. Em seus rugidos e sons guturais, lembrou do conforto, lembrou das tradições, dos momentos calmos, de toda história que havia sido construída ali dentro.

Morina fora forte, a caverna deu-se e findou em sua vida até certo momento. Porém, desde a sua partida, havia um espaço vago ali.

Mesmo depois de aprisionar e nem sequer reagir, a caverna ainda era um lugar que Morina podia dizer que conhecia. Esperava que ela pudesse ser mais aconchegante, mesmo se tratando de uma fortaleza de rocha e areia que apenas urrava por que havia mais um espaço vago naquela concha onde tudo ecoava. Mas em sua cabeça, seu papel era voltar para aquele lugar e abafar os urros enquanto sua vida passava além daquela luz.

A liberdade, ainda assim, aparecia sedutora e mostrava mais e mais vida a cada vez que Morina tencionava voltar para a caverna e reencontrar sua “zona de conforto”. A liberdade a fazia se desafiar, viver. Mas comprometer-se com a liberdade, ao mesmo tempo que significava trair sua promessa de não se comprometer com nada, parecia aumentar os urros da caverna. Cada passo mais distante era uma balança entre o ser firme em deixar seu lugar seguro e seguir em frente, manter a promessa de não se comprometer e entregar-se por completo ao mundo desconhecido que a liberdade traria.

Seus pensamentos a afligiam de tal forma, que suas ações passaram a vir todas pelos sentimentos. Seu coração, sem cérebro, clamava por tanto e não conseguia levá-la a decisão alguma. Quando ouvia ou ruídos da caverna, logo postava-se a correr em sua direção. A cada vez que se afastava da liberdade, sentia um vazio, uma tristeza de voltar pra lá, que parava na boca buscando razões para voltar, buscando razões para partir, mas o coração já não pulsava por um lado apenas. A idéia de perder o conforto e a liberdade era atormentadora. A solidão, por mais que passasse por sua cabeça, não entrava em seu coração.

O passado na caverna não fora de um todo triste. Suas memórias anteriores a levavam a pensar se voltaria a se sentir tão bem quanto fora tempo atrás, mas a idéia de perder a liberdade voltava a sua cabeça como um furação e seu coração já doía de tanto que havia de trabalhar. Amava seu passado na caverna, as aprendia a amar cada vez mais sua liberdade no presente.

A caverna insistia que não poderia preencher aquele espaço, a liberdade gritava que a escolha era dela, mas que as conseqüências vinham com essas escolhas e, por mais que parecesse, todos os passos que ela escolhesse poderiam ser dados, em outro momento na direção contrária.

Morina ouvia a liberdade como ouvia a caverna e ambas as vozes pareciam ecoar da mesma forma, mas, por mais que seu coração não decidisse, seu corpo, sempre que se afastava da liberdade, voltava a clamar por ela.

Ao ver a tremenda aflição de Morina, a liberdade cuidou para que suas escolhas a levassem não mais para sua seu final, contudo para suas certezas. Levou-a a pensar mais e descansar seu coração, a ver além da caverna e da liberdade, mas qual era o sentido da caverna e qual o significado da liberdade. A liberdade abandonou Morina.

A caverna, seu refugio, tornou-se o único lugar onde Morina, desprovida de sua então amada liberdade, poderia voltar. Contudo, mais uma vez, ao se deparar com a boca da caverna, não conseguiu seguir. Viu-se imóvel, procurou uma forma de viver ali sem pensar no que havia visto lá fora, sem pensar no que sofrera por tempos ali dentro, quando hesitou.

A caverna que lhe dera tanto, oferecia mais espaço. Porém, depois de ver quanto poderia ter com a liberdade, mesmo tudo não parecia tanto. Suas idéias traiam suas vontades e Morina correu para fora da caverna, mais uma vez, e gritou, mais uma vez. Dessa vez pela liberdade.

Fadigadas, a caverna e a liberdade, puseram-se a esperar a decisão final de Morina. Digna do que escolhesse, deu-se à libardade. Livre, viu-se como presa. Não mais à caverna, mas ao sentimento que alimentara por esta em outro tempo distante.

Preocupada com Morina, a liberdade desceu até a caverna e tentou entender melhor se abandonar a menina seria o melhor a fazer. Posto que em suas dúvidas, livre ou presa, Morina, que viu-se tão contente algum dia na caverna e novamente tão contente ao lado da liberdade, não conseguia mais encontrar a felicidade que era quem buscara por tanto tempo.

Na caverna, viu-se em um lugar frio, triste, não saberia dizer se fora a ausência de tão querida menina que a deixara assim, mas arriscou o diálogo como forma de encontrar uma forma de ajudar Morina a encontrar a tão buscada felicidade.

- Boa noite, posto que não há dia por aqui.

- Quem está aí – respondeu a caverna.

- A liberdade. Temo que não seja bem vinda, posto que conquistei o apresso de alguém que consideras tão valiosa.

- Não tenho raiva de você. Apenas não sei bem o que dizer.

- Confesso que jamais soube o que era estar tão preso, mas faço por um bem maior, pela felicidade de alguém que dizemos amar.

- Nobre de sua parte, contudo ainda não sei o que posso dizer.

- Confesso que tenho uma pergunta que pode lhe ajudar. Mesmo sabendo que, no primeiro momento, não deste importância para a partida de Morina, o que a fez clamar por sua volta justamente no momento em que soube que ela tinha encontrado felicidade?

- Minhas atitudes não têm explicação. Percebi meu erro e a amo. Seu espaço está vago, mas tornei-me apenas uma caverna vazia após sua partida. Antes, contava com o encanto dos seus sorrisos, das suas palavras, porém, de tanto que tive, não vi mais beleza, não vi mais graça. Quando perdi, perdi certo de que a teria de volta. O mundo é muito cruel, ela é muito minha.

- Mas por que a queres de volta?

- Não há explicação. Sinto o que sinto e apenas o sinto. O eco nessas paredes machuca. Este abrigo não tem sentido sem ela. Aqui apenas jaz a carcaça de uma casa abandonada.

- O que é o amor senão o querer bem?

- Concordo com você.

- Então por que arruinar a felicidade de quem se ama apenas por doer? Amor não é sacrifício? Ela não estava feliz outra vez? Por que não deixá-la?

- Não posso explicar meus sentimentos. Sei que ela me ama e eu a amo.

- Espero que a faça feliz caso ela lhe escolha e saiba que eu farei o que estiver em meu alcance para fazer o mesmo se eu for a escolhida.

- Obrigado.

Ao sair da caverna, a liberdade que nunca soube o que era prisão, viu-se presa. Tornou-se densa, voltou à Morina com um ar diferente. Toda a magia parecia apagada. Mas Morina parecia entender que em meio a tantas voltas, a liberdade se perdera e, na busca de um sentido para escolher entre uma caverna e uma vida ao lado da liberdade, encontrou-se a questionar o que haveria de bom em estar presa a uma caverna.

A liberdade fez de Morina a sua caverna. E enquanto lutava pela felicidade da menina, se escondia à sua sombra. Fez-se indisposta a mudar. Tornou-se pálida, mórbida. Passo a passo caminhava para se tornar a própria Morina e, em sua busca por respostas, perdeu-se naquela sombra.

Ao ver que a liberdade não soprava mais os caminhos que seguia, Morina afundou-se em culpa e cegou para a felicidade. Nada mais parecia ser correto. Estar só era abandonar o conforto e a novidade. O conforto não lhe parecia mais tão confortável e a liberdade tinha uma aparência estranha, incomum.

Morina, o consolo da caverna e a sombra da liberdade, tornou-se o fardo de seus dois amores. Confusa, triste, sem perspectivas, buscava uma solução para sua própria felicidade já que não tivera sucesso em suas ações.

A liberdade, por sua vez, reuniu forças e convenceu Morina a voltar para a caverna. Esta, por sua vez, também abalada com as indecisões de Morina, encontrou alguém que pudesse por em seu lugar e desistiu de Morina no momento em que soube que sua volta seria condicional. Posto que seu apreço pela liberdade tornara-se tão grande que seu conforto não era apenas ali.

Abandonada, mais uma vez, pela caverna, Morina correu para os braços da liberdade. Esta já não era a mesma, mas via na pobre menina uma razão pela qual lutar. Acolheu-a e tentou aconselhar e deixar claro que nada é o fim e nenhum novo começo é necessariamente o último começo.

Após tanto tempo, Morina não ouvia mais. A razão lhe trazia sofrimento, a emoção não fazia diferente. Tudo que ouvira só lhe trouxe tristeza, mas estava disposta a ser feliz. E a liberdade lhe parecia a única opção.

Com a liberdade abalada, Morina sentiu-se presa. Num impulso resolveu se afastar de tudo. Foi para longe de tudo que vivia e viu tudo de longe.

A liberdade, após algum tempo sem sua sombra, reencontrou-se. Voltou a soprar e correr. Sentiu falta da menina, mas sabia que era o melhor. Era um caminho para encontrar a felicidade.

Morina, no entanto, foi o mais distante que pôde, porém percebeu que sem a liberdade é difícil ser feliz. Foi firme até onde pôde. Conheceu pessoas, lugares, comidas. Assim mesmo, a liberdade, mesmo que tão distante, lhe comovia.

Voltou antes do programado e correu para os braços da liberdade. Agora mais leve outra vez, voltou a conquistar o que havia perdido em meio às dúvidas que Morina trouxe consigo.

Morina, ainda cansada e traumatizada com tantas perguntas, ainda não entendia a liberdade. Achava que o que era uma fase tinha sido algo em que a liberdade havia se tornado. Por algum tempo ainda teve medo de estar presa àquela liberdade que se comportara tão estranhamente por algum momento. Contudo, dia após dia, sentiu-se mais e mais livre. Morina voltou a sonhar, a amar.

A caverna, Morina nunca esqueceu. Optou por pensar que quem quer que tenha tomado seu lugar que já não era mais seu, haveria de confortar a caverna assim como a caverna havia a confortado por tanto tempo.

A liberdade tomou um lugar em seu coração que ela já mais imaginara que existia.

Junto com a liberdade, Morina encontrou a felicidade num mundo claro e cheio de descobertas. Jamais ambas cegaram para o mundo.


A.S.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Passagens, Passagens

Temo que a solidão de meus passos não seja culpa de ninguém além de mim mesmo. É possível, que em um daqueles momentos em que fazemos escolhas que não poderemos voltar atrás, escolhi a tristeza no lugar da felicidade e não notei por estar cego para ambas “virtudes”. Alguns passos à frente, alguns olhares ao longe tiraram o foco do meu antigo agora e, na esperança de ser livre e mais feliz, sucumbi na escolha. Acabei com meus sorrisos, com meus sonhos e até mesmo com minha beleza interior que sonhava com o bem de todos os que me rodeavam.

Já iluminei vários caminhos e me gabei por tanto. Porém, não notei as sombras que contornaram cada façanha minha. Os corações que parti, a feridas que abri, a incapacidade que instalei nas memórias e sentimentos de tantos que se aproximaram. Pus-me, enfim, a escolher, por razões lógicas, quais seriam as perdas e lucros que me fariam escolher. Deixei meu coração de lado. Deixei a felicidade de lado e virei carne e lógica.

Quanto mais profundo se está em um poço, mais difícil é entender quando se sai dele. Qualquer sinal de luz já é um paraíso após algum tempo vivendo em plena escuridão. E quando um feixe de luz brilha, algumas vezes, paramos de nos esforçar e vivemos, mesmo que afundados, profundamente, a ilusão de estarmos na superfície. Até que, por estarmos tão distante da boca do poço, afundamos outra vez, posto que o caminho é mais curto e o esforço que se faz para alcançar uma pequena distancia acima é infinitamente maior que o de se iludir com a possibilidade de alguém te puxar. Logo, relaxamos outra e outra vez, levando à vida a culpa de não sermos felizes nunca. Mas a verdade é que não nos esforçamos o bastante.

O passado deixou suas marcas, seus traços e algumas raízes que jamais nos largarão. Contudo, é mais fácil viver com isso que viver fingindo que nada aconteceu. O passado há de ser a base e sustentação do presente. Quem não o conhece ou o ignora, tende a repeti-lo.

O futuro, tão aguardado, quando menos esperamos está em nossas faces. A dúvida é quanto ao que fazer quando ele chega. Pensamos tanto, planejamos tanto que poucas vezes pensamos no “e se chegar?”. Caso chegue, esteja preparado para vivê-lo. O futuro não é um conto de fada, mas o resultado de esforços (ou não) que nos cobram atitudes. O futuro não estará sempre tão a frente. Quem pensa demais no futuro não vive o agora.

O agora sim, transforma, alimenta, machuca, fere. O agora é sempre real. E é sempre agora que podemos mudar ou mantermo-nos os mesmos ou até voltar ao que éramos antes. E é o agora que vivemos sem pensar, mas pensando em viver melhor os próximos agoras e nos preparando para viver os novos agoras.

Hoje é tudo o que temos, pois amanhã ninguém sabe.


A.S.

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Nada de Paz

Queria uma vida tranqüila, mas não resisto a um desafio. Mesmo que demande tempo, toda conquista é mais bem quista que um acaso, toda vitória é mais comemorada que um acerto. Não vejo glórias, porém não consigo deixar de pensar que uma história é mais digna de ser contada quando aventuras, dramas e tanto mais são as raízes de um resultado esperado ou não.

Não conto louros, mas vivo de histórias. Um capitulo de minha vida que não seja contado como história nada mais é que uma temporada em que morri por algum tempo. A vida é feita de emoções, se resguardar e se poupar é praticar espaços de tempo sem vida. E, digam o que disserem, o que há de melhor na vida é viver!


A.S.