quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Sem Título

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Mal percebia o sorriso largo em seu rosto até que soluçou tão involuntariamente quanto como aceitou o beijo. Olhava nos olhos felizes à sua frente procurando esconder a alegria tão surpreendente que lhe tomava o rosto e o corpo inteiro. Havia de fazer-se imperceptível e não ousou sequer agir como pensava. Deu-lhe o sorriso e tornou a encarar. Dizia-se suficientemente normal para o que tinha acabado de acontecer. Não esboçaria reação diferente enquanto não houvesse a certeza de que o que acontecera não fora mero acaso. Um caso banal, um beijo esperado por dois durante anos. Tremeram-lhe as pernas, mas sentiu-se feliz de se encontrar bem confortável numa cadeira. As batidas do coração poderiam ser facilmente disfarçadas enquanto não houvesse um abraço. Fora um momento de proximidade que, mesmo com relutância das duas partes, permitiu o encontro entre as bocas. Disseram-se:

- O que me impede de não querer?

- A mesma vontade que tenho. E o que me impede de tentar?

- A insegurança que dou. Mas o que lhe faz querer?

- A forma como me olha. - E se lhe visse mais de perto?
Aproximou seu rosto do outro.

- E se não me importasse e apenas lhe deixasse se divertir?
Manteve-se quieto.

- E se lhe falasse mais próximo do ouvido?
Arrastou a cadeira para mais perto, baixou o tom da voz e disse:

- Se as palavras ao seus ouvidos fossem tão doces que não pudesse resistir?

- Pensaria nelas como falsas já que te divertes me dando insegurança.
Encostou, levemente, os lábios na orelha direita deixando que o toque fosse suave e o ar que expirava fosse breve e desconcertante.

- E se lhe falasse tudo que é mentira com a verdade tocando em sua pele? Toques não enganam, sensações muito menos.

- E se falássemos sobre verdade sem mais suposições – falava devagar, afastando-se da tentação, enquanto, agora, seus lábios é que tocavam o outro rosto até chegar ao lado da boca finalizando a pergunta – o que você me falaria agora?

Com os olhos bem fixos nos olhos, uma sensação estranha de tremor de frio e calor lhe tomando o ventre, entregou-se.