quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Harmônico

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Na falta de ritmo ou cadência, tocou um samba desconcertado, mas acertou na letra, improvisada. Soltou os pensamentos em rimas mal encontradas e se fez feliz com o que fazia. Ao longe, fora observado por quem passava e não ouvia. De fora, até parecia um samba feito, mal tocado. Mas as cordas eram velhas, o violão baixo e as mãos eram lentas. Trocando acorde a acorde, perdia o tom da voz e escorregava naquela letra que lhe aparecia na hora.

Ao deleite de um segundo refrão, observou-se, só. Jamais se viu tão bem acompanhado. Achou-se no sentido de encontrar-se e se deu mais de si como presente para aquela data que, desde aquele momento, tornava-se comemorativa. Abraçou-se mais ao instrumento, feriu as cordas com menos força até que encostou o ouvido na caixa. Podia sentir-se parte dela. E soava junto, harmonizava cada nota saída da canção que não voltaria a ouvir.

Deu-se por demais ao encanto daquela melodia, daquela letra. Agarrou-se ainda mais ao violão até que sonhou com o resto da música. Despertou e partiu, sem musa, sem música, sem sono, mas com o sorriso de quem encontrou o par perfeito.


(A.S.)

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