quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Tempo Corrido

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Aparentemente textos curtos são mais lidos. Os longos assustam. Lógica comum no mundo da velocidade, no tempo que informação é só o básico, por que informação demais é prejudicial. Lemos bulas, livros e o que mais aparecer, correndo, sempre correndo. Não há mais contemplação na leitura. Apenas informação.

Poucos os que me falam de livros pelo prazer de suas histórias. Tenho ouvido coisas como: “O autor quis dizer isso”, “O contexto parece niilista.” Há tempos não ouço nada sobre como é a história, o fulano que corre atrás da cicrana e o beltrano que corre o mundo para salva-lo. Histórias têm virado tanto clichê que as análises mais profundas e conjecturas infinitas sobre assuntos já passados e relacionados aos sistemas ou análises de sistemas atuais baseadas em idéias passadas que culminaram em tal ou tal resultado na sociedade atual.

Histórias deixaram de ser histórias, estória já nem se fala mais. Algumas palavras se perdem numa sociedade dotada de maioria não leitora e minoria alfabetizada. Os contos e pequenas peças são mais apresentáveis. Os filmes contam um resumo das narrativas dos livros, logo, para quê lê-los?

Neste descaso com as palavras, nesta nova literatura internetês (linguagem utilizada no meio virtual), o que resta aos amantes da leitura são os velhos livros. Pois de novo só há o produto de análises mais profundas e conjecturas infinitas sobre assuntos já passados e relacionados aos sistemas ou análises de sistemas atuais baseadas em idéias passadas que culminam em tal ou tal resultado na sociedade atual.

Paro por aqui para não assustar com o tamanho do texto.

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(A.S.)

terça-feira, 10 de agosto de 2010

Por Dentro

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Já não espantavam as tamanhas paredes, vazias de cores, despidas de quadros. Tampouco a decoração, já há muito abandonada, que se dispunha como sempre em posição, porém tão conservadas quanto o resto. Ali, onde vibrava a vida, só vagavam insetos. Cortinas transpareciam, disformes, tecidas pelo tempo, a imagem que se tinha. Sem deixar passar as poltronas, massacradas pelo uso, pelo mofo, pelos pêlos que ainda vagavam por ali. Deixava-se entender que nem sempre fora assim. Sim, as manchas no tapete imundo ainda eram visíveis, assim como o pó da madeira há muito comida pelos, já obesos, cupins. Passou-se o tempo e lá estava a ferrugem após comer cada abajur sem lâmpada que ainda restava. Não circulava vento e o mofo tomava as paredes com a pouca umidade que restava naquele lugar. Dominava tudo. Fora, só se via a brisa que nada lembrava. Tudo se foi. Não sobrava nada naquele lugar, senão o esquecimento.

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Bom Dia (A.S.)

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Tenho visto o sol nascer novamente....


Ah! Essas idas e vindas da vida, o que resta é aproveitar enquanto não está quente demais, ou frio demais, nem claro demais, nem escuro demais, quando, ao mesmo tempo, pode ser hora de ir deitar, ou de levantar, posto que o amanhecer é o começo do dia de tantos, mas apenas o fim de mais uma noite para os boêmios.
Despertando para a vida ou acordando para os sonhos,

Eis, outra vez,

O sol voltando a nascer.

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Lembranças (A.S.)

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Se eu pudesse apagar algo do meu passado, acho que começaria com as fotos. Certos detalhes que, mesmo debaixo de poeira, fechados em álbuns, sempre voltam pra me atormentar. Gosto de sentir saudades quando sei que poderei matá-las. Mas não gosto de sentir falta do passado. Este nunca volta, mas as imagens estão lá. Presas aos papéis que, enquanto não se desgastam com o tempo, com o clima ou mesmo com o fogo, se mantêm ali. Algumas a nos assombrar, outras nos trazendo certa nostalgia.
Se eu pudesse apagar algo do meu passado, não sei bem por onde começaria. Foi tão bom viver aquilo, foi tão ruim quando acabou. Eternizar seria difícil, mas, será que apagando alguns erros ficaria mais bela a minha história? Algumas vezes parece que se voltasse no tempo o ideal seria não dizer aquela frase, seria mais apropriado entender melhor o porquê sentia para depois me expressar e evitar o erro. Assim mesmo, depois do erro, das tristezas e das melancolias acumuladas com o tempo, a vontade que se dá é de apagar tudo do princípio. Desde o momento em que a história deu a entender que iria existir. Dá vontade de apagar tudo. O primeiro abraço, o primeiro sorriso.
Se eu pudesse apagar algo do meu passado, acho que começaria pelo meu passado. E viveria meu presente pensando que no futuro eu não quero querer apagá-lo.
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quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Sem Título

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Mal percebia o sorriso largo em seu rosto até que soluçou tão involuntariamente quanto como aceitou o beijo. Olhava nos olhos felizes à sua frente procurando esconder a alegria tão surpreendente que lhe tomava o rosto e o corpo inteiro. Havia de fazer-se imperceptível e não ousou sequer agir como pensava. Deu-lhe o sorriso e tornou a encarar. Dizia-se suficientemente normal para o que tinha acabado de acontecer. Não esboçaria reação diferente enquanto não houvesse a certeza de que o que acontecera não fora mero acaso. Um caso banal, um beijo esperado por dois durante anos. Tremeram-lhe as pernas, mas sentiu-se feliz de se encontrar bem confortável numa cadeira. As batidas do coração poderiam ser facilmente disfarçadas enquanto não houvesse um abraço. Fora um momento de proximidade que, mesmo com relutância das duas partes, permitiu o encontro entre as bocas. Disseram-se:

- O que me impede de não querer?

- A mesma vontade que tenho. E o que me impede de tentar?

- A insegurança que dou. Mas o que lhe faz querer?

- A forma como me olha. - E se lhe visse mais de perto?
Aproximou seu rosto do outro.

- E se não me importasse e apenas lhe deixasse se divertir?
Manteve-se quieto.

- E se lhe falasse mais próximo do ouvido?
Arrastou a cadeira para mais perto, baixou o tom da voz e disse:

- Se as palavras ao seus ouvidos fossem tão doces que não pudesse resistir?

- Pensaria nelas como falsas já que te divertes me dando insegurança.
Encostou, levemente, os lábios na orelha direita deixando que o toque fosse suave e o ar que expirava fosse breve e desconcertante.

- E se lhe falasse tudo que é mentira com a verdade tocando em sua pele? Toques não enganam, sensações muito menos.

- E se falássemos sobre verdade sem mais suposições – falava devagar, afastando-se da tentação, enquanto, agora, seus lábios é que tocavam o outro rosto até chegar ao lado da boca finalizando a pergunta – o que você me falaria agora?

Com os olhos bem fixos nos olhos, uma sensação estranha de tremor de frio e calor lhe tomando o ventre, entregou-se.